quinta-feira, 3 de março de 2016

PATRICIA HIGHSMITH


Hoje na Sábado escrevo sobre Carol, de Patricia Highsmith (1921-1995). Por vezes, um escritor torna-se conhecido em todo o mundo pela adaptação ao cinema de um livro seu, e com Highsmith foi logo com o primeiro, Strangers on a Train (1950), um dos thrillers mais populares do século XX, a partir do qual Hitchcock realizou o clássico que conhecemos por O Desconhecido do Norte Expresso. Sucede o mesmo com O Preço do Sal (1952), que agora lemos como Carol. No posfácio, Ana Luísa Amaral, tradutora da obra, lembra que o livro, tratando a relação amorosa entre duas mulheres, foi publicado sob o pseudónimo de Claire Morgan, assim se mantendo durante mais de três décadas. Seria preciso esperar por 1990, quando o livro foi publicado no Reino Unido com o nome da autora, para que a generalidade dos leitores ficasse a par daquilo que era um segredo de polichinelo no milieu literário. Nunca tendo escondido a condição lésbica, Patricia Highsmith não era activista gay. Mesmo da forma elegante como desenvolve a intriga, compreende-se que nos anos 1950, no auge do McCarthismo, não fosse fácil tratar a história de amor entre Carol e Therese sem lhe associar conotação pejorativa e sanção moral. Highsmith, que se tornaria um ícone da literatura policial (não esquecer que foi a criadora de Mr. Ripley), inspirou-se na figura de uma antiga amante, Virginia K. Catherwood, uma mulher casada da alta sociedade de Filadélfia, para compor a personagem de Carol, também casada e mãe. Ao comprar uma boneca para a filha, Carol conhece Therese, então com 19 anos, a trabalhar em part-time num armazém de Manhattan. Foi esse o duplo detonador do romance, isto é, da relação entre ambas e da escrita do livro. A realidade interpõe-se: na posse de provas do adultério, o marido retira-lhe a custódia da filha: «Julgo que ela me vai poder visitar umas duas tardes por ano. Muito de vez em quando. Perdi completamente. […] O Harge contou tudo aos advogados — o que eles ainda não sabiam.» Mas também perde Therese, que recusa uma vida a duas. Seria pleonástico sublinhar a destreza com que Highsmith nos envolve na trama psicológica. Quatro estrelas.